sexta-feira, 8 de julho de 2011

TRÊS POEMAS QUE FALAM DE AMOR


ESTA AREIA FINA - FERNANDO ASSIS PACHECO

Não sei
se o que chamam amor é este apaziguamento.
Não sei se comias fogo. Tuas abelhas
voam agora em círculos tranquilos.
Mães serenam seus filhos no ventre,
não sei se o que enfim chamam
amor é esta areia fina.

Agora estamos um dentro do outro,
fazemos longas visitas deslumbradas
porque «o nosso prazer lembra um rio vagaroso
no meio de juncos ao cair da tarde.»

As palavras tornam-se esquivas. Com o silêncio
falaríamos melhor de tudo isto.
Não sei se o que chamam amor
é a cama desfeita o sol fugindo,
uma vontade louca de beber
a grandes goles a noite entorpecente.

Com o silêncio, o silêncio sem nome:
morrermos a meio do filme
simples, calada, delicadamente.
Eras tu, amor? — Era eu, era eu!

Um barco junto à margem. E cegonhas.


FLORES DO VERÃO - GASTÃO CRUZ

Estás no meio das árvores dos
pássaros das
sombras no regresso da praia
as flores do verão também estampadas
na solidão da saia outras crescendo
naturais sendo umas o futuro e as da
natureza
o momento presente a estampa que
te envolve saindo
dos arbustos movidos pla leveza
imperceptível quase do espírito
ar
que virá um dia
transformar-te
como do rés da terra um vento baixo
subindo ao peitoril onde te inclinas
para as
flores do verão ainda



CÂNTICO - JOSÉ RÉGIO


Num impudor de estátua ou de vencida,
coxas abertas, sem defesa... nua

ante a minha vigília, a noite, e a lua,
ela, agora, descansa, adormecida.
Dos seus mamilos roxo-azuis, em ferida,
meu olhar desce aonde o sexo estua.
Choro... e porquê? Meu sonho, irreal, flutua
sobre funduras e confins da vida.

Minhas lágrimas caem-lhe nos peitos...
enquanto o luar a numba, inerte, gasta
da ternura feroz do meu amplexo.
Cantam-me as veias poemas nunca feitos...
e eu pouso a boca, religiosa e casta,
sobre a flor esmagada do seu sexo.


in 366 poemas que falam de amor, uma antologia organizada por Vasco da Graça Moura, Quetzal Editores

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