Meu Deus, me dê a coragem
de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites,
todos vazios de Tua presença.
Me dê a coragem de considerar esse vazio
como uma plenitude.
Faça com que eu seja a Tua amante humilde,
entrelaçada a Ti em êxtase.
Faça com que eu possa falar
com este vazio tremendo
e receber como resposta
o amor materno que nutre e embala.
Faça com que eu tenha a coragem de Te amar,
sem odiar as Tuas ofensas à minha alma e ao meu corpo.
Faça com que a solidão não me destrua.
Faça com que minha solidão me sirva de companhia.
Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Faça com que eu saiba ficar com o nada
e mesmo assim me sentir
como se estivesse plena de tudo.
Receba em teus braços
o meu pecado de pensar.
Clarice Lispector
1 comentário:
Apesar de tudo eu tenho um Deus, como a Clarice Lispector, de quem não consigo libertar-me. A partir dele muitas vezes ponho-me a monologar. É este mesmo Deus ausente a quem ela suplica que faça tanto por ela, a quem suplica o perdão das suas reflexões.Há um Deus a quem todos nós pedimos, mesmo sabendo que não nos ouve...
Ainda ontem pensei numa frase simples de José Saramago, exibida num destaque do Actual de 26 de junho que dizia extraordinariamente bem o que pensava:«Creio que a morte é a inventora de Deus. Se fôssemos imortais não teríamos nenhum motivo para inventar um Deus».
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