Esta foto é uma das muitas espectaculares da colecção do francês Philippe Ramette que gosta de tirar fotos a si próprio em contextos surreais como... no fundo do mar. Que bela foto para acariciar o poema de Sophia que a seguir transcrevo.
FUNDO DO MAR
No fundo do mar há brancos pavores,
Onde as plantas são animais
E os animais são flores.
Mundo silencioso que não atinge
A agitação das ondas.
Abrem-se rindo conchas redondas,
Baloiça o cavalo-marinho.
Um polvo avança
No desalinho
Dos seus mil braços,
Uma flor dança,
Sem ruído vibram os espaços.
Sobre a areia o tempo poisa
Leve como um lenço.
Mas por mais bela que seja cada coisa
Tem um monstro em si suspenso.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Obra Poética I
Obra Poética I
Este é um dos meus poemas predilectos dos 14 livros de poesia que Sophia editou. Cada vez que o leio encontro-lhe sons marítimos profundos diferentes, cores de matizes variantes como no mar de Espinho e uma beleza intocável que me faz lembrar que ela é um reino muito pequeno, como disse há muitos séculos atrás Sócrates. Para mim ela é o próprio mar. Adoro o título que o inicia - "Fundo do Mar" - e o torna misteriosamente apetecido como se para o compreendermos necessitássemos de uma leitura subaquática com máscara de oxigénio, barbatanas gigantes e olhos abertos para as maiores surpresas: encantos e desencantos. Cada vez que leio este poema, ganho consciência da efemeridade da própria beleza do mundo, dos outros... e sei que também dentro de mim há um fundo a que nem eu chego. Gosto de lê-lo em voz alta aos meus meninos porque é também um verdadeiro poema da nossa infância.
1 comentário:
Querida amiguinha:
Também sou uma apaixonada pela Sophia. Nos poemas dela respiro o mar e quando sinto saudades basta-me saboreá-los pois fico de imediato impregnada de maresia... Este poema é lindo... A foto escolhida é magnífica e o fotógrafo parece o polvo que vasculha pelo oceano em busca, quem sabe, da felicidade perdida? Muitos beijos. Anabela
Enviar um comentário