quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Histórias de Amor - Robert Walser


A contracapa diz muito:

"Robert Walser escreveu cerca de mil narrativas curtas. Volker Michels, um profundo conhecedor da obra de Walser, escolheu oitenta dessas narrativas que têm a ver com o amor e ordenou-as cronologicamente. No seu conjunto, estes textos evidenciam a grande variedade expressiva de Walser e o modo pouco convencional como encarava o erotismo e o amor. Robert Walser revela um amplo amore mundi, que envolve as raparigas e os pássaros, as nuvens e as mulheres distantes, as flores e os campos e os enamorados que neles passeiam. Com alguns achados verbais insólitos e abundantes diminutivos, Walser capta aquilo que transforma a mente dos apaixonados num mundo perturbado e intenso. São histórias repletas de humor corrosivo, que umas vezes põem em causa a hipocrísia moral, outras são irónicas imitações da literatura amorosa ou burlescas recriações dos sonhos da adolescência.
Robert Walser nasceu em Biel na Suiça, em 1878. Entre 1904 e 1933, publicou uma vasta e original obra poética e romanesca que entusiasmou a crítica (são exemplos Walter Benjamin e Max Brod) e alguns dos principais escritores de língua alemã, como Hesse, Kafka e Musil. Em 1929 ingressou voluntariamente num manicómio. Foi encontrado morto, na neve, por um grupo de crianças no dia de Natal de 1956, quando dava um dos seus habituais passeios."
Mais ainda diz este conto:
A única Mulher

Conheço uma importante musa que nada sabe de poesia, mas que é ela própria um poema, o que para um poeta é muito importante. Quem é insolente com ela apenas se depara com o seu magnífico espanto. Já lhe dediquei o meu canto uma ou duas vezes, mas por ora fiquei sempre aquém. Ela afugentou-me e eu ri-me alegremente, como se ela tivesse concedido uma noite ao poeta, e ele respondesse com frieza, porque a sua fantasia já lhe tivesse oferecido a visão do corpo dela. Nunca mais voltarei a amar. Ela fez de mim uma criança que admira o mundo, que segue a mais bela doutrina e teme a Deus. Os sapatos dela não são maravilhosos. Mas gosto bastante do guardanapo com que ela brinca. Nunca poderei voltar a vê-la, e no entanto sou feliz, ainda que na verdade não devesse ser. Fui um sem-vergonha com ela, porque a sua presença me deixava a tremer e porque queria dar uma ilusão de superioridade e porque achava tolo e quase odiava este estremecimento, este amor. Mas quando estamos longe um do outro, brinco com ela e afago-a, salto como um doido, como um rapazinho tonto. Seria bem capaz de a esquecer aí uns quatro anos, mas depois tudo voltaria outra vez. É espantoso saber isto! Nunca tinha reparado no poder que uma rapariga tem. Toda a lealdade e tudo o que em mim há de bom fica prostrado por terra diante do vestido da única mulher. Estou tão alegre como só me sinto de manhã cedo, e no entanto é meia-noite, e escrevo estas linhas como se não as fosse dar a ler a ninguém.

1 comentário:

Anabela disse...

doçura

as palavras de Walser são de facto magníficas! Conseguiu de uma forma tão simples expressar todo um amor em potência, talvez incapaz de o fazer verbalmente. Adorei a ideia de mulher poema pois lembrei-me de imediato de uma pessoa: TU! De facto tu és uma MULHER-POEMA!
Fiquei inquieta ao saber a biografia de Walser de quem desconhecia tudo e agora sei mais qualquer coisita! DEixaste-me pois com muita sede ... terás que me emprestar o livro um dia destes

Obrigada AMIGA LINDA-POEMA AMIGA
Anabela