segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O SENHOR ELIOT - GONÇALO M. TAVARES


Para recordar todos os senhores do bairro, um vídeo muito interessante, da Caminho, é este:

Mas o novo livro do bairro, O Senhor Eliot e as Conferências, é uma porta aberta para a gargalhada. É uma ousadia o que Gonçalo M. Tavares faz dizer (aparentemente de forma tão pueril e na superfície do texto!) acerca de  alguns versos que escolheu de uma série de poetas estrangeiros. Cada capítulo é uma conferência proferida pelo Senhor Eliot, frente a um público assistente diminuto mas de enorme gabarito (Borges, Breton, Swedenborg, etc) e uma aventura inconsequente da capacidade de interpretação. Transcrevo um excerto da 1ª conferência, na qual o Senhor Eliot começa por explicar um verso de Cecília Meireles:

Vem ver o dia crescer entre o chão e o céu

Trata-se, em primeiro lugar, podemos pensar, de uma mentira. O dia não cresce. Porém, as coisas não são assim tão simples.
Antes do mais, note-se neste verso que o crescer de um dia não é em direcção aum sítio alto qualquer. O dia poderia crescer em direcção ao topo de um edifício. Mas não. Cresce em direcção ao céu.
Reparem ainda que o dia, no verso de Cecília Meireles, vem do chão; o chão visto assim como o outro lado do céu.
Uma dúvida se instala de imediato sobre este verso.
De que chão se trata?
Porque se o dia, imaginemos, crescer desde o chão de uma montanha de três mil metros de altura até ao céu, será evidente que quem vem ver tem menos para ver, pois o percurso é menor. Se se tratasse aqui de algo comercial, seria perfeitamente legítimo que alguém que vem ver o dia crescer entre o chão de uma montanha de três mil metros e o céu não pague o mesmo. (...)

Gonçalo M. Tavares, O Senhor Eliot e as Conferências, Caminho

1 comentário:

Tiago M. Franco disse...

Este é sem dúvida um pequeno grande livro. Já o li, voltei a ler e a reler outra vez. Quanto mais o leio mais maravilhoso se torna. Simplesmente fantástico.