segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

OS REIS MAGOS - RUBEM ALVES


No dia 25 de Dezembro o Tiago e a Ana Luís viveram um Natal a mais através deste conto que lhes li. Também li para mim própria. Para eu ouvir e ver todas as palavras que Rubem Alves escreveu e as tornar presentes naquela sala maior onde se encontrava toda a família. Elas entraram para junto de nós e transformaram-nos a todos, de uma maneira estranha, em crianças. Deixo um pequeno excerto para que também tu entres dentro desse outro Natal (mais? ou menos? verdadeiro do que aquele que agendamos anualmente) e que dura naquelas páginas há muitos e muitos anos porque há sempre leitores para ele. A Literatura brasileira tem disto:

«A estrela iluminava uma gruta. Os reis se aproximaram. Na gruta havia vacas, cavalos, burros, ovelhas. Era uma estrebaria. Mas, junto com os animais, uma pequena família: um jovem e uma jovem que amamentava um nenezinho recém-nascido. Era só isso. Nada mais.

Perceberam que haviam se enganado: não era a estrela que iluminava a cena. Era o nenezinho que iluminava a estrela. E olhando bem para ela puderam ver, nela refletido como num espelho, o rosto da criancinha. E disseram: “O universo é um berço onde uma criança dorme!“.
Aí uma coisa estranha aconteceu: ao olhar para o nenezinho os reis perdiam a sua compostura real; eram dominados por uma vontade incontrolável de rir. E quando riam, ficavam leves e começavam a flutuar. Era assim: quem visse o menino se transformava em anjo...
Os reis, em meio aos risos e vôos, olharam cada um para o outro e disseram: “Nossa busca chegou ao fim. Encontramos a alegria. Para se ter alegria é preciso voltar a ser criança...“. Ato contínuo tomaram suas coroas, capas de veludo, dinheiro, ouro, jóias – coisas de adulto - e as depuseram no chão, ao lado das vacas e dos burros... Eram pesadas demais. E partiram leves, ora andando, ora pulando, ora voando, mas sempre rindo.
“Vou mudar de vida“, disse Gaspar. “É horrível ter de estar estudando ciência o tempo todo. Vou me transformar em poeta...“
“Eu também vou mudar de vida“, disse Balt-hazar. “É horrível estar rezando o tempo todo. Vou ser palhaço. O riso é o início da oração.“
Ao que Mélek-hor acrescentou: “E eu descobri o prazer supremo, que vem sempre acompanhado de alegria: brincar. Vou ser um fabricante de brinquedos. Quem brinca volta a ser criança. E quem volta a ser criança está de volta no Paraíso.“.
E assim partiram, cada um por num caminho. E se você, nas suas andanças, se encontrar com um poeta, um palhaço ou um fabricante de brinquedos, pergunte se ele não tem notícias de uns três reis...»


Rubem Alves, Transparências da Eternidade, Verus, 2002

Podes entrar na casa do autor e ler o conto na íntegra porque ele é muito encantador. Quando mudar de casa, quero construir uma como esta de Rubem Alves, sólida e singular:

http://www.rubemalves.com.br/osreismagos.htm

1 comentário:

Anabela disse...

Doçura

Que bela lição de vida!!! BRINCAR!!! Perdemos essa capacidade bem como a de sermos crianças... mas eu sinto-me uma criança adulta e não me resigno a perder certos privilégios...
Quero continuar a brincar!!!
muitos beijinhos e obrigada por me fazeres sonhar muitooooooo