[15-02-2010] Pedro Teixeira Neves
http://www.pnetliteratura.pt/cronica.asp?id=1768
Ivo Machado nasceu nos Açores em 1958. Publicou: Alguns Anos de Pastor, poesia, 1981; Três Variações de um Sonho, poesia, 1995; O Homem que nunca existiu, teatro, 1997; Cinco Cantos com Lorca e Outros Poemas, poesia, 1998 (homenagem particular ao poeta de Granada, tendo sido convidado a apresentar o livro naquela cidade andaluza durante as comemorações do centenário do nascimento de Garcia Lorca e, em Fevereiro de 2002, traduzido e editado naquele país numa edição bilingue, pela LITERASTUR); Nunca Outros Olhos Seus Olhos Viram, novela, 1998; Adágios de Benquerença, poesia, 2001; Os Limos do Verbo, poesia, 2005; Verbo Possível, poesia, 2006. Ainda em 2006, publica Poemas Fora de Casa, antologia que reúne a sua poesia, celebrando assim os vinte e cinco anos da publicação de Alguns Anos de Pastor, seu primeiro livro. Parte da sua poesia está traduzida para castelhano, inglês, eslovaco, húngaro, italiano e bósnio. Tem colaboração dispersa por revistas literárias no país e estrangeiro, estando ainda representado em inúmeras antologias. Do primeiro livro, Fernando Lopes-Graça, musicou para canto lírico sete poemas a que chamou — Sete Breves Canções do Mar dos Açores. Em 1987 deixou as ilhas para viver no Porto.
És um escritor bisexto, não muito regular, pelo menos em matéria de publicação; a que se deve isso?
Há uma vida para além dos versos, e necessito de a viver intensamente.
A poesia intende responder ou antes questionar?
A poesia é uma interrogação permanente, e o poeta é aquele que utiliza o idioma da nossa perplexidade.
Procuras a poesia ou és por ela procurado?
O poema move-se lentamente em sedução até que me disponha a recolher as palavras, como se elas navegassem num ribeiro e as recolhesse uma a uma, para as cuidar e lhes dar uma outra roupagem.
Achas verdade aquilo que se diz de que hoje em dia há mais gente a escrever poesia do que a lê-la?
Sempre foi assim, creio, pois a história do Homem é a história da Poesia. Muitos são os que não lêem um verso, mas é ao verso que recorrem quando se manifesta o desassossego, ou simplesmente para interrogar o mundo.
Quais os poetas que te influenciaram?
Desde logo, e entre nós, Camilo Pessanha e Sophia. Mas fora de portas António Machado e Lorca. Na década de noventa chegou-me a poesia do brasileiro Lêdo Ivo.
Ser poeta é estar à vida em estado de vigília? O que é ser poeta?
Os povos inventaram e renovaram a língua e as linguagens, e o poeta descobriu a sua abundância e a vastíssima riqueza dos seus vazios, dos vazios que é preciso ocupar com a necessidade de dizer e de escutar como numa declaração de amor repetida sempre e sempre como as palavras que os amantes exigem para viver. Poeta é aquele que estende a sua mão para que as borboletas e os tentilhões, direi que todos os seres, alcancem o porvir infinito.
Os versos assumem muitas vezes na tua poesia a função de regresso, à infância, ao passado, às ilhas que deixaste, aos amigos idos. Em que medida te é necessária a poesia nesse regressar?
A poesia de algum modo é uma imobilidade, e o poeta aturdido pelos ruídos do universo e pelos brilhos das viagens, cedo entende que o seu maior segredo é uma imobilidade porque poesia é, também, uma evasão da qual a partida corresponde sempre a um regresso.
A poesia é filha do silêncio?
Filha, irmã e noiva. E da luz.
Quanto há de inspiração e quanto de transpiração na tua poesia?
Nem uma coisa nem outra, antes trabalho e muita alegria.
A poesia ajuda-te a viver?
Naturalmente. A poesia é também a água que mata a minha sede.
E tens alguma ideia acerca do que as pessoas procurem na poesia?
Como leitor, e para além de respostas, sinto que ela é um dos raros territórios possíveis de habitar.
Tens algum livro prestes a publicar?
Sim, no começo do próximo ano, três décadas após o aparecimento do meu primeiro livro.
Quando soubeste que querias ser poeta?
Sem qualquer hesitação no dia em que, quieto como uma mosca, me comovi (teria os meus catorze anos) ao escutar o pai de um amigo dizendo de memória Llanto Por Ignacio Sánchez Mejías, de Lorca. Ainda trago no ouvido alguns dos seus versos:
A las cinco de la tarde.
Eran las cinco en punto de la tarde […]
Eran las cinco en todos los relojes.
Eran las cinco en sombra de la tarde.
Recordo esse dia e essa leitura com alguma frequência. E lembro ainda que nesse dia, de regresso a casa, senti que queria ser como aquele homem. Ele, o pai do meu amigo, era poeta. Chamava-se Emanuel Félix.
Nas Correntes os poetas nadam contra a corrente?
Dentro da corrente, de certo modo ele é a onda.
O que te faz gostar de ir às Correntes?
Vou às correntes com o mesmo espírito que me levou à primeira, e de todas as edições seguintes, isto é, participar com humildade numa festa que é um encontro e reencontro de amigos (a cada ano um novo amigo chega) e uma mesa enorme ao redor das palavras.
1 comentário:
Linda amiga, o jantar a fumegar no tacho, o cheiro dele a alimentar-nos estômago e a entrevista que me envias a explicar a poesia, a lembrar Ivo Machado...Gostei muito de saber tudo o que ele responde e cmo ele responde.Mil bjs
Pat
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